What's wrong with my tongue/ These words keep slipping away/ I stutter I stumble/ Like I've got nothing to say/ I'm feeling nervous/ Trying to be so perfect (Avril Lavigne)

Wednesday, March 15, 2006

"Exactamente naquela noite enquanto estava deitada no meu futon com o quarto a andar à roda, resolvi ser como o pescador que hora atrás de hora apanha o peixe com a sua rede. Sempre que pensamentos sobre o Director subiam à tona vindos de dentro de mim, eu pescava-os cá para fora, e pescáva-os outra vez, e outra, até não sobrarem nenhuns. Teria sido um sistema inteligente, sem dúvida, se eu o tivesse conseguido fazer funcionar. Mas quando tinha nem que fosse um único pensamento sobre ele, nunca o conseguia apanhar antes que fugisse a correr, e me levasse exactamente para o local de onde tinha banido os meus pensamentos. Muitas vezes me obriguei a parar e dizia-me a mim própria: Não penses no Director, pensa antes em Nobu. E muito deliberadamente, imaginava-me a encontrar com Nobu algures em Quioto. Mas nesse momento qualquer coisa corria sempre mal. O local que eu fantasiava podia ter sido onde muitas vezes imaginara encontrar-me com o Director, por exemplo... e então, num instante, ficava mais uma vez perdida em penamentos sobre o Director.
Andei assim nisto durante semanas, a tentar reconstruir-me. Às vezes, quando por um momento ficava livre dos pensamentos sobre o Director, começava a sentir como se um poço se tivesse aberto dentro de mim. Não tinha apetite, nem quando a pequena Etsuko vinha à noite trazer-me uma taça de caldo de carne. As poucas vezes em que consegui concentrar-me claramente em Nobu, fiquei tão entorpecida que me parecia não sentir absolutamente nada.
Mas agora sei que o nosso mundo não é mais permanente do que uma onda a erguer-se no oceano. E quaisquer que sejam as nossas lutas e triunfos, como quer que os possamos sofrer, muito rapidamente se dissolvem todos numa aguada, como a tinta de pintar no papel."
"Memórias de uma Gueixa" - Arthur Golden

2 Comments:

Blogger Sílvia S. said...

Cá está a melga de serviço.
O último parágrafo é particularmente marcante. Lembro-me perfeitamente de o ter lido.
E esse pedaço revela-se particularmente irónico dado o desfecho do livro. É que o destino por vezes acontece-nos sem nos darmos conta. O destino é provavelmente uma obra de engenharia, como uma rede complexa de vidas que se enleiam. E este livro expõe isso de uma maneira muito humana e sem cair em grandes abstracções.
Bem pescado;)

12:23 AM

 
Anonymous Anonymous said...

Passo a minha vida a reconstruir-me, a tentar ser firme quase como que por desespero. Porque qualquer coisa corre sempre mal para cobrir o que correu bem. Tantas vezes acontece que nem sei se acredite no bem ou na felicidade das coisas e das pessoas.

1:56 AM

 

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