What's wrong with my tongue/ These words keep slipping away/ I stutter I stumble/ Like I've got nothing to say/ I'm feeling nervous/ Trying to be so perfect (Avril Lavigne)

Friday, February 01, 2008

E Portugal?

A abordagem superficial da história, no início deste livro, mostra-nos que Portugal nunca se tornou a potência dominante da Europa, o «coração» da Ordem Mercantil, que poderia ter sido no século XVI, essencialmente por três razões.

Por um lado, Portugal sempre privilegiou a defesa da agricultura, das indústrias alimentares, do rendimento da terra e dos interesses burocráticos que lhe estão associados, em detrimento da indústria, do lucro, da mobilidade, da inovação e das tecnologias do movimento. Depois, o país viveu na nostalgia de um passado idealizado, fazendo a reverência ao poder, com receio do povo e das suas classes burocráticas, constantemente reconstituídas. Perseguiu as suas elites ligadas ao comércio e gastou os imensos recursos provenientes da América em indústrias ultrapassadas ou em produtos importados do resto da Europa.

Por outro lado, Portugal nunca se mostrou capaz de controlar os mares do ponto de vista comercial, nem mesmo no período em que dispunha de uma força naval e de uma marinha militar e mercante sem rival. Não soube dar prioridade ao desenvolvimento de um porto de envergadura mundial e de um mercado financeiro que os seus sectores agrícola e industrial poderiam ter feito ascender ao estatuto de «coração», no ponto de passagem entre o Atlântico e o Mediterrâneo.

Por fim, o país nunca conseguiu formar, promover, nem acolher uma classe criativa: nunca formou, em número suficiente, marinheiros, engenheiros, investigadores, empresários, comerciantes, industriais; nunca atraiu para o seu território suficientes cientistas, financeiros, fundadores de empresas: apenas teólogos, militares, senhores feudais, artistas comanditados pelo poder, e administradores encarregues de sintetizar e de administrar, mas sobretudo de correr riscos. Tal como a Espanha, os dirigentes portugueses expulsaram judeus e muçulmanos, instrumentos da modernidade no mercado.

Em suma, Portugal nunca se tornou um «coração» porque não soube, em nenhum momento, reger-se pelas leis da história do futuro que aqui descrevi.

O futuro de Portugal dependerá, de hoje em diante, da forma como o país souber respeitar estas leis e seguir as regras do sucesso: criar um ambiente relacional; suscitar o desejo de um destino comum; favorecer uma criação mais livre; construir um grande porto e uma grande praça financeira; fornecer aos cidadãos, de modo equitativo, formação nos novos saberes; dominar as tecnologias do futuro; elaborar uma geopolítica; constituir as alianças necessárias. Portugal encontra-se numa posição geográfica crucial: no cruzamento da América, da África e da Europa; pode fazer uso de um extraordinário potencial de crescimento se aproveitar esta localização triplamente vantajosa.

Para enfrentar o século XXI com serenidade, Portugal deverá vencer o desafio colocado pelo envelhecimento da sua população. Embora a imigração, nomeadamente dos países do Leste Europeu, tenha permitido um abrandamento deste fenómeno, Portugal tem uma das taxas de natalidade mais baixas da Europa, com 1,4 filhos por mulher. A este ritmo, o declínio populacional que o país conheceu em finais dos anos 80 recomeçará a partir de 2015, com uma população que não ultrapassará os 11 milhões de habitantes.

Portugal deverá ainda voltar-se para as profissões de maior valor acrescentado, por forma a garantir a sua competitividade futura. Será igualmente necessário um considerável esforço de investimento em matéria de inovação e educação superior. O Estado está consciente desta necessidade (...). O país terá de dar sequência a este esforço, melhorando a qualidade do ensino superior e desenvolvendo a formação profissional, se quiser obter taxas de crescimento anual superiores a 2% depois de 2008.



Jacques Attali, Breve História do Futuro